Aeroporto de Paris, 08 de novembro de 2020
Estou voltando para o Brasil, depois de uma temporada de dois meses em Helsinki com o meu namorado (ele mora lá). O Trump perdeu as eleições nos Estados Unidos (!) e a tal da segunda onda da pandemia do corona vírus está acontecendo na Europa. Eu quase não percebi a pandemia lá em Helsinki (a gente só usa máscara no transporte público e nas lojas) e vocês não devem estar notando nada de muito diferente no Brasil - a não ser que você esteja no Amapá.
Aqui no aeroporto de Paris a coisa tá feia, até mandei uma foto no grupo da família contando meu momento perrengue chique: achei que ia passar fome porque todas as cafeterias e restaurantes estavam fechados, mas por sorte achei uma baguete recheada numa loja de revistas e comprei também pacote de palmier, para ficar mais felizinha.
Coisas que eu deveria fazer na minha própria cidade
O Hemingway's não estava muito cheio apesar de ser sexta à noite em Helsinki. Estávamos rindo, jogando um jogo de tabuleiro sobre filmes e tomando mojitos. Eles têm esses jogos e vários livros para quem quiser pegar, o que é de se esperar num bar com nome de escritor, certo?
Carlos foi lá fora fumar e, nesses cinco minutos em que fiquei sozinha, entrou um homem de uns 60 anos (?) com uma mala pequena, dessas de levar na cabine do avião, sabe? Ele sentou-se numa mesa para quatro pessoas e pediu uma garrafa de vinho. Só uma taça. Não tem garçom aqui e ele mesmo se serviu e depois tirou um livro de dentro da mala.
Carlos voltou, continuamos nosso jogo de adivinhação sobre filmes (voltei para casa prometendo que ia assistir Ghost, do outro lado da vida). O homem ficou lá, lendo e tomando um vinho. No caminho de volta para casa vimos um coelho na rua. Sério.
A gente vai tão longe para encontrar o que está dentro da gente.
Escrevi essa frase meio que sem pensar, por cima da primeira foto que tirei do Deserto do Atacama. Olhar para o deserto e perceber como o planeta é imenso e nós piquiticos me fez perceber coisas que eu ainda não entendi direito até hoje, provavelmente porque eu não escrevi sobre elas.
Essa história de ir longe para se conhecer tem se voltado para mim.
Não sou a pessoa mais observadora do mundo, não, mas gosto de olhar a vida dos outros, principalmente quando estou longe de casa. É mais confortável e mais fácil de perceber coisas novas quando a gente está fora da nossa zona de conforto, onde tudo é do jeito que é e pronto. E eu tenho vergonha de reparar no que as pessoas estão fazendo quando estou, sei lá, baldeando da linha verde para amarela.
Só fico reparando a vida alheia quando eu estou longe, onde as vidas não se parecem com a minha. E tenho aprendido coisas, quer ver?
Observando os franceses passeando com suas baguetes em Paris, entendi que posso ficar mais a vontade no mundo. De madrugada, numa balada em Budapeste, vi uma menina comendo uma cenoura e percebi que tá tudo bem ser meio estranho (foda-se o que vão pensar, vou comer minha cenoura). Com os chilenos, em 2019, aprendi que lutar com energia e determinação pelos nossos direitos é uma coisa bonita e necessária. Em Itacoatiara, no interior do Amazonas, aprendi com a minha avó que tudo que a gente coloca amor floresce como o jardim que ela cultivava na casa dela. Agora minha vozinha foi fazer um jardim no céu.
E com os finlandeses, principalmente com aquele senhor lá no Hemingway’s, aprendi que está tudo bem ficar sozinha, sair sozinha. Eu já conhecia a palavra solitude, mas pesquisei o significado para ter certeza de que é mesmo esse o nome da privacidade serena, plena e que não tem nada a ver com a solidão (triste, tristinha).
Balanço da solitude e uma dica de café em Helsinki
Eu já viajei sozinha algumas vezes e, portanto fiz algumas coisas sozinha. Passeios pelas cidades (Santiago, Cidade do Cabo, Paris, São Paulo...) basicamente. Cinema sozinha: duas vezes na vida. Bar sozinha: acho que nunca.
Agora que eu sou dessas que sai sozinha mesmo, posso contar para vocês que comecei este texto no meu café o meu preferido em Helsinki, o Brooklyn Cafe (cafeteria é um ótimo lugar para ir sozinha). Como em quase qualquer cafeteria do mundo, lá é ótimo para fazer coisas que amo: ler um livrinho, escrever e tomar um café. O café é bem forte e ótimo, tem um bagel delicioso, cupcakes bonitinhos e as donas&proprietárias são duas irmãs: gostei porque fiquei pensando que poderia ser eu e a Láisa, mas, principalmente, porque valorizar negócios de mulheres é importante para mim.
Como se isso não bastasse, lá, tem clube do livro e de escritores que estará de volta em breve com encontros presenciais. Me aguardem!
Voltando à São Paulo e à solitude, pergunto: alguém conhece algum café em São Paulo que também tem clube de escritores? Qual a chance de isso não existir em São Paulo?
Pois é, eu tive de ir até Helsinque para descobrir que eu adoraria conhecer um café com clube de literatura.
Precisava disso tudo? Precisava né.
Bom domingo e até semana que vem 🥑✨
Tássia
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Ainda quero que a gente consiga viver mais perto uma da outra, viver solitudes juntas.
não conheço, mas sempre quis participar de um clube de leitura! ler o mesmo livro e poder discutir que danado vai acontecer e comentar as coisas chocantes ou revoltantes que as personagens insistem em fazer NO MOMENTO em que a raiva ou angústia sobem e não meses ou anos depois quando descubro que alguém tá lendo. já ensaiei começar um com amigues, mas nunca andou :/ espero que (se) encontre (em) um!