Você já migrou para o TikTok? É um pouco assim que funcionam as redes sociais: a gente troca quando os parentes chatos chegam. Se eles estão lá, não deve ser tão legal assim. Até a gente vira o parente chato.
Helsinque, 30 de janeiro de 2022
Dizem que a idade pesa, mas me sinto leve a cada ano. Quanto mais o tempo passa, mais aprendo sobre mim mesma e como posso levar a vida de um jeito mais tranquilo e feliz.
Hoje é o meu aniversário de 34 anos e eu decidi abrir um caderno antigo, com anotações de 2018, onde eu escrevia os meus pensamentos. Como você pode imaginar, eu escrevia principalmente quando estava chateada ou quando queria refletir sobre um assunto.
Não foi para relembrar do passado.
Eu quis reler só para ver o que mudou de lá para cá. E, nas primeiras páginas, achei tudo meio bobo, mas — pensando melhor — deve ser porque aquelas preocupações não fazem mais sentindo. Passou.
2018 foi cheio de desafios. Tinha algo novo querendo florescer no meu asfalto velho, sólido e desgastado. E — apesar disso — o que mais me chamou atenção no caderno, veja só, foi o tamanho das letras. Os pensamentos estão caligrafados em uma letra tão pequena, correta, apertada e estreita que até parece que não tinha espaço suficiente para escrever, mesmo com tantas folhas em branco. Nem parecia a minha caligrafia.
Passei as folhas rapidamente em busca de anotações mais recentes, porque eu não estava reconhecendo aquela letra de quatro anos atrás. Mais para frente, encontrei anotações de 2020, pós-pandêmicas. Me reconheci nas letras espalhadas e crescentes que passeiam por onde querem, não seguem as linhas, não tentam caber, mudam de cor. Pulam por cima de adesivos e fitas coloridas. Ufa, sou eu ali.
Para entender melhor, fotografei as páginas e comparei, lado a lado e me impressionei com a diferença entre elas.
As letras miúdas falavam de miudezas. Procuravam em si o problema do outro. Desesperadas para caber, para pertencer. Elas falam de si mesmas como se precisassem ser corrigidas, melhoradas. Letrinhas cheias de culpa, como se atrapalhassem o fluxo da natureza com sua minúscula existência. Pediam desculpa ao caderno por riscarem a página e à caneta, por usar sua tinta.
Desconfio que se a caneta de repente estourasse e borrasse o papel, aquelas palavras iriam se torturar até encontrar um jeito de cuidar melhor de tudo que estava fora, como se dentro delas morassem todos os problemas do mundo.
Isso era grande para elas. Era enorme.
Demorou até que entendessem que o melhor seria que tivessem o tamanho que precisavam ter. Levou dois anos para que percebessem que, se ocupassem os espaços livremente, seriam felizes e multiplicariam essa felicidade pelo mundo. As letrinhas entenderam que o esforço para caber entre as linhas sufocava sua expressão, sua voz, seus rabiscos de novas histórias.
Felizmente, cresceram para serem livres para sempre.
Amém.
Pegando carona no meme da semana passada: 5 curiosidades sobre mim
Nasci numa cidadezinha chamada Itacoatiara, no interior do Amazonas, às margens do Rio Amazonas — lá é tão o lindo o pôr do sol.
Já morei em 8 cidades. Uma delas foi Caruaru e eu trabalhava numa TV local. Vez ou outra, quando ia fazer alguma reportagem na rua, encontrava o repórter de um programa sensacionalista campeão de memes.
Ganhei um netbook em um concurso cultural da O.B. com um vídeo ensinando as pessoas a usar absorvente interno.
Minha mão esquerda não fecha direito porque quebrei em 2018 e nunca fiz fisioterapia.
Já caí de cara no chão andando de skate e um dos meus dentes é todo rachado e eu morro de medo que ele quebre.
Por favor, deletem
outro dia, estava comendo as panquecas maravilhosas que meu namorado fez para gente e resolvi colocar um vídeo de desenho animado na TV porque era domingo de manhã e sei lá, achei que seria legal. Abri qualquer coisa no YouTube e o primeiro que apareceu foi este vídeo da Looney Tunes (de 2019):
O vídeo é um compilado para o Dia dos Namorados e começa com o Pernalonga se disfarçando de mulher para enganar a própria namorada. Vestido de mulher, ele interpreta o estereótipo da mulher fofoqueira, fala mal de si mesmo para Lola terminar com ele. Nessa parte, já comecei a achar tudo meio esquisito e só piorou.
Olha o que encontrei:
Patolino fica revoltado e termina o namoro porque achou que a namorada dele (Tina Russo) tinha um filho. Ele só se acalma quando ela explica que o bebê é sobrinho dela.
Depois, ele rouba a senha do computador dela, lê os e-mails e é super grosso-babaca-abusivo. Tina passa pano e fala que ele é o amor da vida dela.
Ainda tem a Lola no papel da mulher desesperada para casar, louca e boba que só pensa em “se apaixonar” por homens que exaltem sua beleza e feminilidade (que horror, sério).
E aí ela escreve um texto para ajudar o Patolino conquistar QUALQUER mulher. Leiam o texto:
Você é uma mulher muito muito bonita. Você é o símbolo da graça, do estilo e da feminilidade. Você é a minha melhor amiga. Aliás, você é a única amiga que preciso. Vamos nos livrar dos nossos amigos e seremos nossos únicos amigos. Devemos cortar qualquer parente que não apoie nosso relacionamento. E também devemos trabalhar juntos na mesma empresa, porque se tem uma coisa que sei é que se largarmos todos nossos amigos, nossas famílias e trabalharmos juntos, com certeza teremos um relacionamento perfeito.
Esse texto é um atestado de relacionamento abusivo. Por favor, deletem.
Espaço da leitora
Fui surpreendida com a quantidade de leitoras que me responderam dizendo que também sofriam devido à maldição da Gisele Bündchen e que se lembravam da entrevista em que ela conta que se ela limpasse o chão, daria para comer nele, de tão limpo.
A história ainda rendeu um papo interessante com uma amiga (Keren) e celebramos a liberdade de não se importar com a limpeza da casa. Uma das conclusões que tivemos foi: a sujeira geralmente incomoda na hora que a gente resolve limpá-la, que é quando descobrimos que ela existe.
O Rafa (sim, temos um leitor!) se lembrou dessa tirinha aqui:
E eu acabei lembrando desta thread:
… que me fez chegar nesta matéria sobre Tolstoi e Sophia Behrs.
Por fim, deixo a frase que a Karen me escreveu e eu amei:
Amo o poder feminino e acredito que o patriarcado só existe porque homem tem muito medo de mulher mesmo.
📮 Se quiser mandar seu recado, é só me escrever por e-mail ou deixar nos comentários aqui no Substack.
Parabéns especiais para minhas amigas que também fazem aniversário hoje: Vivi, Giovanna e Ighara. 🎂✨🥂🎉
Bom domingo e até a próxima. 🥑✨
Dizem que a idade pesa
Lindão esse texto sobre relembrar o passado, hein? Reflexão fudida sobre a forma da escrita, até fui olhar minhas anotações aqui. Feliz aniversário, jovem!