Pensa antes
todo mundo diz que é para gente falar exatamente o que estamos sentindo, colocar para fora, explicar o sentimento. Mas com sentimento não é bem assim, né? Tem que entender primeiro qual que é, pensar, refletir, filosofar, pensar mais um pouco. O sentimento adora se confundir com as minhocas da nossa cabeça.
Detesto certo e errado. Detesto mesmo. Quem me conhece de perto dirá que é porque sou aquariana, sei lá. Não gosto de ditar coisas, pelo contrário, gosto de ver fluir e amo quando surgem novos caminhos justamente porque não seguimos o mapa. Acho bonito, acho leve, acho gostoso. A gente explora, pensa de um jeito completamente novo, inova. Legal.
Apesar dessa liberdade gostosa, tem jeito errado de fazer certas coisas. Quebra-cabeça de mil peças: você pode até ir fazendo de qualquer jeito, mas uma hora passará raiva e ter que retomar pelas bordas e separar as peças azuis. Ouvindo Duda Beat pela milésima vez, pensei uma coisa aqui: tem jeito errado de amar. Ah, tem sim e eu quero falar isso para vocês.
a música da Duda Beat é esta aqui:
Primeiro, lembremos os tipos: tem o amor de Eros (erótico) apaixonado, sexual, aquela safadeza boa, delícia. Tem o amor de amigo, aristotélico, baseado na confiança. Tem o amor fraterno, que a gente deseja que todo mundo conheça. E tem também o amor incondicional, divino, que foi abraçado pelos cristãos, coisa linda de Deus.
Além disso, gosto da intensidade de Bertrand Russell sobre o amor como um tempero mágico da vida:
“Busquei, primeiro, o amor, porque ele produz êxtase – êxtase tão grande que, não raro, eu teria sacrificado todo o resto da minha vida por umas poucas horas dessa alegria. Procurei-o, ainda, porque o amor nos liberta da solidão – essa solidão terrível pela qual nossa trêmula consciência observa, além dos limites do mundo, esse abismo frio e desalentador. Busquei-o, finalmente, porque vi na união do amor, numa miniatura mística, algo que prefigurava a visão que os santos e os poetas imaginavam do céu. Eis o que busquei e, embora isso possa parecer demasiado bom para a vida humana, foi isso que – afinal – encontrei".
E também das palavras de Simone de Beauvoir:
"O ideal seria que dois seres humanos, cada um deles se bastando a si próprio perfeitamente, se ligassem um ao outro pelo livre consentimento de seu amor."
Somos livres para amar como quisermos, monogâmico, poligâmico, amor-próprio, amor só de mãe, sei lá. Pode colocar toda a sua criatividade aqui. O amor é lindo, uma delícia, entretanto, tem um jeito errado de amar, tem sim.
É que vi por aí gente que se apaixona, se apega, diz que ama (quem sou eu para duvidar?) e, depois que o relacionamento engata e ganha intimidade, resolve que a pessoa amada tem que mudar: de cabelo, de emprego, de postura, beber menos, falar baixo, menos, né?, não faz nada direito, precisa mudar pro seu próprio bem. E por aí vai.
Eu já passei por isso, já amei errado, assim bem torto mesmo. E dava tudo errado, eu chorava, depois prometia que aquilo nunca mais ia acontecer. Promessas de mudanças mútuas porque precisaríamos ser pessoas diferentes para que o relacionamento desse certo. Apego e carência com roupinha de eu te amo, jantar à luz de velas, presentes caros. Os anos acumulados me encaravam com aqueles olhinhos carentes dizendo: “você não vai desistir depois de todo esse tempo, né?”. Mas não era o passado que estava sendo jogado pela janela, era o presente.
Melhor deixar Beauvoir explicar:
“Seria preciso que o casamento fosse a união de duas existências autônomas, não uma abdicação, uma anexação, uma fuga, um remédio. Antes de poder ser uma esposa e mãe, precisa tornar-se uma pessoa. Esse casal equilibrado não é uma utopia.”
Só que não é todo mundo que entende isso, né? Com sorte — e nos melhores casos — um basta na situação resolve o problema. Ou a terapia, ou fica inviável e daí resolvem-se. Ou, vive-se assim — e pensando melhor, só posso dizer que amar assim é errado para mim.
Eu, que já amei errado tantas vezes, hoje concordo com Simone de Beauvoir: “casal equilibrado não é uma utopia”. Quando mudei a rota, encontrei lá do outro lado um amor bem mais forte, outro tipo de amor.
E acho que agora entendo o êxtase de Russell. É sobre amar quem a pessoa é, exatamente como ela é. Parece até ser infinito, porque tem um incentivo à autenticidade do outro e quanto mais ele se torna quem ele é, conhece a si mesmo, aproveita a vida, evolui, é feliz, mais eu o amo.
Espero que nunca acabe.
Bom domingo e até a semana que vem.
Tássia
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rolou no Instagram
Por falar em autenticidade, faz uns dias que penso sobre casais interessantes em filmes, livros ou histórias da realidade e se você também gosta de histórias de amor, eu deixei tudo nos meus destaques.