Coisas que amo em Helsinki #1
Depois de dois anos morando na capital da Finlândia, decidi refletir sobre o lugar que escolhemos viver e a vida que queremos levar.
Na escrita e na vida a gente pode fingir para parecer mais interessante. Isso atrai likes e curiosos, mas o que faz as pessoas ficarem é o nosso lado cru, assustador, que espanta quem não entende e segura quem consegue encarar a carne exposta.
A gente veste as palavras, mas elas ficam mais bonitas nuas.
Olá, você!
Às vezes, a gente acaba deixando para outra hora e esquece, mas estou aqui pra te lembrar que o primeiro mês é grátis e apoiar a brunch mag custa apenas R$3 dinheirinhos por mês.
Era para ser uma lista com 20 coisas, uma linha pra cada. Mas há tanto para dizer que resolvi criar uma série mensal sobre a cidade que escolhi viver: Helsinki. Hoje, vou falar sobre a personalidade da capital da Finlândia. Nos próximos episódios, vamos de gastronomia (por que tanto brasileiro odeia?), lazer, cultura, natureza, sauna e mais!
Coisas que amo em Helsinki #1
Eu mudei no verão de 2021. Vim de São Paulo, mas sou de Pernambuco nascida no Amazonas. Estava cansada da loucura paulista, do trânsito, das distâncias, da marginal, do mau cheiro do Tietê, da correria, do ritmo de trabalhar e trabalhar. Não fiquei rica em São Paulo, não me dei bem. Aprendi bastante, ralei e fui engolida. Antes de pensar em vir pra cá, comecei a estudar inglês com uma ideia no fundo da minha cabeça de morar em Amsterdam. A vida deu um capote e eu vim parar em Helsinki — longe, muito longe, e fria.
Imagina poder abrir o mapa do mundo e escolher onde quer morar — não foi o meu caso, infelizmente. Quando a gente começou a namorar, meu marido já morava aqui, e eu estava cansada de SP. É por isso que precisei de tempo para responder com sinceridade “quero mesmo morar aqui?” e justificar minha resposta.
Morar na cidade mais feliz do mundo, não me faz necessariamente mais feliz — pois é. É sobre a vida que a gente leva em cada lugar, as pessoas que a gente encontra e o papel que a gente performa. Em São Paulo, era uma mulher de 30 anos estéril, sem energia para criar e desesperada para ser bem sucedida num trabalho que nunca senti prazer em realizar. Foi o papel que encontrei para mim, consegui me encaixar. Não consegui viver em autenticidade nos anos que estive lá — quando essa ficha caiu, eu comecei a querer fugir. No começo de 2019, eu lembro de comentar com a minha chefe da época que eu toparia morar em Manaus— a empresa tinha um time e eu tenho família lá. Quem sabe, né? Não tinha clareza do que estava se passando do lado de dentro, mas tinha algo ali.
Fui para São Paulo pelo trabalho e, para Helsinki, vim por causa do amor. Sou mais feliz no relacionamento do que no trabalho, verdade seja dita. Por outro lado, escrevo, desenho, rabisco, faço bonequinhos de feltro. Costurei pela primeira vez. Às vezes, me sinto meio infantil. Não lembro de existir assim desde criança, pintei meu cabelo de rosa essa semana. É claro que a essas coisas se somam os fatores mais práticos como dinheiro, cultura do país, clima, distância da família e até idade dos seus pais. Sim, se seus pais estiverem muito velhinhos, é mais complicado — essa conversa é recorrente entre as minhas amigas imigrantes. A Finlândia é super segura, mas, tem que gostar de frio e cerveja quente. Já pensou odiar calor e morar em Recife, ou no Rio de Janeiro? Não dá.
Quando aluguei o último apartamento que morei em São Paulo, o critério inegociável era “ter piscina” porque eu amo água. Essa foi provavelmente a minha atitude mais significativa na busca de uma vida em autenticidade. Ainda não sei exatamente como é a vida que desejo, mas tenho uma pasta no Pinterest. Falta a descrição completa.
Alerta: este texto não é uma tentativa de convencer as pessoas a morarem aqui, só a minha irmã e as minhas melhores amigas. Estou apenas pensando alto sobre o cenário ideal para a vida que a gente merece.
Coisas que eu amo em Helsinki #1
Helsinki tem 630 mil habitantes, isso é menos do que a Zona Oeste de São Paulo. Sexta à noite, é difícil achar um restaurante em que todas as mesas não estejam reservadas. Além dos parques, Helsinki tem florestas por todo o lado — o Google chama de refúgios selvagens, eu gosto. Muitas vezes, esses lugares já pisam fora da fronteira e formam uma região metropolitana que pode ser alcançada facilmente, de metrô, trem ou ônibus. As ilhas também fazem parte do cenário e, com um bilhete comum, você pode pegar um barco até Suomelinna, por exemplo.
É leve e sem pressa
Quando cheguei, logo percebi que estava entrando numa zona diferente, outro ritmo de viver. Eu, tô sempre na pressinha, mesmo que não tenha nada me esperando. Impaciente à toa, chegando em cima da hora e levantando antes de todo mundo. Aqui você não sente isso e, quando acontece, estranha. Ainda não descobri como os finlandeses conseguem ser tão bons em gerenciar o tempo. Sempre chegam um pouco antes do horário, bem penteados, tranquilos. Até esperam uns minutinhos do lado de fora para tocar a campainha às 17:00 em ponto. Desconfio que seja porque acordam bem cedo. Almoçam às onze, às vezes até antes, e devem tomar café da manhã bem cedinho.
só 3 reais
Criativa e colorida, mesmo quando cinza
Não é só no verão que Helsinki transborda em cores. O ano todo a cidade respira design e inovação. Talvez fique ainda mais fácil de perceber porque fico no centro do distrito de design, uns 10 minutos a pé do Museu de Design. Estou rodeada por lojas e galerias que transpiram a criatividade: objetos de decoração, moda, antiquários, brechós, escritórios de arquitetura e arte. O cenário é sempre inspirador, mesmo nos dias mais cinzas. Quando escurece, Helsinki e outras cidades em volta têm seus festivais de luz. O Lux acontece coincidentemente sempre na noite mais fria de janeiro, haja coragem pra sair de casa, mas é lindo.
Recentemente, conheci mulheres do time de design de serviço da prefeitura. Helsinki tem um time de mulheres incríveis pensando a cidade — isso se reflete na rua, nos eventos. No site dá para ter um gostinho.
Mobilidade fluida
Dia desses, conversei sobre a falta de mobilidade de Brasília e como pode ser difícil cultivar amizades e aproveitar a cidade se você não dirigir. Aqui, é o oposto. É fácil sair de casa — mas o frio pode atrapalhar, sejamos sinceras. O bilhete mais simples custa 3,10 euros (zona AB) e, do centro até o aeroporto, custa 4,10 euros (zona ABC). Você pode usar o quanto quiser dentro da zona, por 80 minutos. A cidade é bem servida de ônibus, bonde, metrô e trem. Nunca vi um lugar impossível acessar de transporte público. A mobilidade fluida é uma paz de espírito, porque mesmo que leve uma hora e meia de ônibus, eu consigo chegar em lugares como este:
E, por ser super segura, dá para usar os serviços públicos a qualquer hora do dia ou da noite. Você acaba indo.
🥐
Não tenho vocabulário para essas nuances, mas esse conjunto tem me permitido gostar mais da vida que levo aqui. O ritmo, as cores, o balanço — tudo isso e muito mais formam um quebra-cabeça de mil peças que é a vida que a gente leva. Nem sempre dá para mudar tudo, mas podemos trocar uma pecinha para que vida fique mais parecida com o sonho.
— Sonho não se embala pra viagem.
EXTRA 🫐🍦
Estou re-organizando o roteiro de viagem que fiz especialmente para os meus amigos que vieram me visitar. Na próxima edição desta série vou compartilhar com vocês! É um mini-roteiro com muitos detalhes de Helsinki e um dia em Tallinn, na Estônia.
O que acha?
Que vontade de fugir para um lugar assim!
Amei a edição! Que delícia de ler!
Se não deu pra convencer a se mudar praí, com certeza deu pra convencer a incluir Helsink no roteiro de viagem (ainda que o roteiro seja só um sonho, uma pasta no pinterest) 💜